3 de fevereiro de 2014

O Presente, de Cecelia Ahern [Resenha #158]

O Presente - Texto


Sinopse: Todos os dias, Lou Suffern luta contra o tempo. Ele tem sempre dois lugares para ir, tem sempre duas coisas a fazer. Quando dorme, sonha com os planos do dia seguinte, e, quando está em casa, com a esposa e os filhos, sua mente está, invariavelmente, em outro lugar. Numa manhã de inverno, Lou encontra Gabe, um morador de rua, sentado no chão, sob o frio e a neve, do lado de fora do imenso edifício onde Suffern trabalha. Os dois começam a conversar, e Lou fica muito intrigado com as informações que recebe de Gabe; informações de alguém que tem observado uniões improváveis entre os colegas de trabalho de Lou, como os encontros da moça de sapatos Loubotin com o rapaz de sapatos pretos... Ansioso por saber de tudo e por manter o controle sobre tudo, Lou entende que seria bom ter Gabe por perto — para ajudá-lo a desmascarar associações que se formam fora de suas vistas — e lhe oferece um emprego. Mas logo o executivo arrepende-se de ajudar Gabe: sua presença o perturba. O ex-mendigo parece estar em dois lugares ao mesmo tempo, e, além disso, Gabe lhe fala umas coisas muito incomuns, como se soubesse do que não deveria saber... Quando começa a entender quem é realmente Gabe, e o que ele faz em sua vida, o executivo percebe que passará pela mais dura das provações. Esta história é sobre uma pessoa que descobre quem é. Sobre uma pessoa cujo interior é revelado a todos que a estimam. E todos são revelados a ela. No momento certo.


Em minha primeira leitura de um livro da autora Cecelia Ahern eu tive problemas de adaptação por não entender seu estilo: quando tive o “A Vez da Minha Vida” em mãos eu estranhei o fato da Vida da personagem principal, Lucy, entrar em contato com ela para que ela pudesse parar de mentir sobre si mesma e colocasse as coisas no lugar. Mas como assim a Vida se tornando corpórea e fazendo contato com a personagem?, eu me perguntava. O que me faltou foi alguém que me deixasse claro o quanto o fantástico é importante e presente na obra da autora, e, mais do que isso, no quanto sua narrativa se apoia nesse fator.

Assim, já consciente, a leitura de “O Livro do Amanhã” fluiu de maneira bem mais agradável, não lutei contra a ideia de um livro que narrava o que aconteceria no dia seguinte com a personagem, a saudosa Tamara, e o livro é uma das melhores leituras que já fiz, confirmando para mim o quanto de uma grande autora a Cecelia tem, e o quão bem ela sabe contar uma história e envolver o leitor. Por isso, começo essa resenha com um aviso: se nunca leram nada da autora, tenham em mente que em seus livros encontrarão a presença de elementos fantásticos, que serão de suma importância no decorrer da leitura.

Em “O Presente”, conhecemos Lou Suffern, um homem ambicioso que tem tudo o que gostaria de ter para provar às outras pessoas o quão “por cima” ele está: um Porsche, uma casa enorme com portões enormes com pássaros esculpidos em metal no topo, ternos caros e casos com suas secretárias; sem contar um emprego importante que o mantém extremamente ocupado e sempre atrasado para estar em algum lugar. Mas atrasado o bastante para que ele conduza sua relação com sua esposa e filhos de forma ritualizada e mecânica – elogiando sua esposa sem ao menos olhar pra ela; dando atenção ao filho apenas quando sob supervisão, para evitar que tenha maiores responsabilidades como dar papinha e trocar fraldas; e, o pior de tudo, reduzindo ao máximo o tempo com eles por, de acordo com suas próprias palavras, cada segundo gasto com sua família é um segundo a menos que ele se relaciona com pessoas importantes em seu trabalho que lhe ajudarão a conquistar um cargo ainda melhor.

E, justamente pela necessidade de autoafirmação que ele possui, logo ficamos sabendo o quão frágil e inferiorizado ele se sente. E é essa sensação que ele tem quando conhece Gabe, um mendigo que pedia esmola em frente ao elegante edifício onde Lou trabalha e que, sem saber a razão, Lou parara certo dia para lhe oferecer um café afim de abater o frio de final de ano que fazia ali, na rua.

Após esse primeiro contato, Lou decide ajudar Gabe, mais por perceber que ele lhe pode ser útil que por um ataque de consciência. É aí que as coisas mudam.

Gabe é misterioso, fala por parábolas, responde perguntas com outras perguntas e está sempre no lugar certo na hora certa. Eu tive medo dele. Eu teria medo de alguém que se colocasse atrás de mim sem eu perceber e dissesse alguma verdade que eu mantinha escondida sob um grande, pesado e empoeirado carpete. Mais ainda, se o tal cara me oferecesse, no décimo quarto andar, a última vaga no elevador dizendo que pegaria o próximo, e, quando eu chegasse ao térreo ele já estivesse lá, me esperando com um sorriso enigmático no rosto, eu gostaria de saber que bruxaria era aquela. Confesso que, se eu tivesse contratado o cara, o demitiria.

Lou começa a se sentir ameaçado pela presença constante de Gabe, por todos gostarem dele, mas, especialmente, por ele fazer com que Lou vá percebendo o quão equivocado ele está nas decisões que toma: apesar de ser um astro em seu trabalho, competente, à prova de erros, charmoso; em sua vida particular é um fracasso, não conseguindo estabelecer conexões com seus próprios filhos, traindo a esposa repetidamente, e ouvindo-a chorar pelos cantos, infeliz. Mas Lou não tem tempo, nunca tem, e escolhas tem de ser feitas, só que parece que ele nunca faz as corretas. Porém Gabe pode ajudá-lo.

Eu sou fã da Cecelia Ahern, mas, apesar de o “O Presente” ter me prendido, ele ficou devendo para o “O Livro do Amanhã”, talvez devido a seus personagens. Mas o livro é muito bom, bem escrito, narrado de forma inteligente – a história nos vai sendo contada através do relato que um policial faz a um garoto, que conhecemos como “O Garoto do Peru”, que, às vésperas do Natal, arremessara um peru pela janela da sala da casa de seu pai, onde ele comemorava o Natal com sua nova família – instigante, que prende o leitor.

Achei que a autora aqui aposta um pouco mais em fornecer ao leitor detalhes psicológicos acerca de como os personagens, principalmente Lou, estão lidando com as situações, e não me dou muito bem com isso, prefiro diálogos, caso contrário tenho dificuldade em me manter focado e com um ritmo linear. Mas não é algo que mate alguém.

É mais um bom livro da autora. Se não a conhece ainda, não perca mais tempo.

 


Mais da autora:

P.S. Eu Te Amo – resenhado pela Jaci Pandora
A Vez da Minha Vida
O Livro do Amanhã


 

O Presente, de Cecelia Ahern (The Gift, 2010 Tradução de Ivar Panazzolo Junior, 2014) – 320 páginas, ISBN 9788581633145, Editora Novo Conceito. [Comprar no Submarino]

{B+}

7 comentários:

  1. Acho que preciso ter tão logo seja possível um reencontro com a Cecelia. Pelo que leio em suas resenhas, ela tem feito tudo o que eu gostaria que ela fizesse. E tom psicológico... bem, acho que já te disse, é onde fico em casa quando o assunto é literatura.

    Cheros Luciano, boa semana para você!

    P.S.: Rotina da segunda, na segunda, isso é auspicioso!

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    1. Eu me tornei fã, me acostumei bem com a escrita dela e hoje nos entendemos bem. Agora eu quero ler o PS ;)

      E que bom que manteve a rotina ;)

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  2. Eu lembro das outras resenhas da autora aqui no blog, mas a única obra que eu conheço mais dela é o PS. Eu Te Amo. Acho meio estranho pensar que ela se apropria de elementos fantásticos, porque, na minha cabeça, literatura fantástica é Neil Gaiman, George R R Martin, Tolkien, enfim... Talvez o caso dela seja um "realismo fantástico", que me lembra muito a obra de Marc Levi.

    Abraços!

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    1. O PS é de longe o maior sucesso da autora, mas eu ainda não o li ;)

      Eu acho que ela usa de muita licença poética e ela sabe muito bem como utilizar o recurso a seu favor, para tornar a narrativa mais dinâmica e passar ao leito o que quer passar. Eu gosto - estranhei muito no princípio - mas agora eu gosto ;)

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  3. É um autoajuda enrustido? rsrsrs
    Adorei a resenha, mas de maneira disfarçada foi isso que entendi. E confesso que gosto muito disso, de mostrar coisas boas, coisas que a gente pode melhorar na vida, sem que isso fique claro. Tipo: "Você tem que ficar mais em casa!". O jeito que ela usa as palavras faz com que a gente entenda o que é melhor, mas é como se ela deixasse a gente pensar sozinho. Será que fui clara?
    rsrs
    Espero que sim. Não tenho o dom de mostrar o que quero que os outros vejam com minhas palavras, assim como a autora faz tão bem!

    Bjkas

    Lelê Tapias
    http://topensandoemler.blogspot.com.br/

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    1. Lelê, foi sim ;) e é isso que eu gosto nela! Ela não assume um tom professoral enquanto nos ensina como lidarmos com nossas vidas, e isso é muito bom. Bom, sou fã dela ;)

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  4. Comprei hoje pra dar pra uma pessoa,por achar a historia interesante, e espero que a pessoa goste :)

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