27 de fevereiro de 2012

A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça [Resenha #039]

imageSinopse: Há quem diga que é o fantasma de um cavaleiro hessiano, cuja cabeça foi arrancada por uma bola de canhão em alguma batalha sem nome durante a Guerra da Independência, e que ocasionalmente é visto pelo povo da região galopando na calada da noite. Sua assombração não fica confinada ao vale, mas estende-se também, vez ou outra, para estradas adjacentes, especialmente para as cercanias de uma igreja não muito distante. De fato, alguns dos mais confiáveis historiadores destas partes, que cuidadosamente coletaram e confrontaram os fatos a respeito desse espectro, alegam que o corpo do cavaleiro foi enterrado no pátio da igreja, e que o fantasma cavalga pelo cenário da batalha numa busca noturna por sua cabeça, e a velocidade incrível com que as vezes passa pelo vale, como um  raio à meia-noite, se deve ao seu atraso, sua pressa para voltar ao terreno da igreja antes do raiar do dia. Tal é o significado geral desta lendária superstição, que forneceu material para diversas histórias incríveis nessa região sombria; e o espectro passou a ser conhecido em todas as histórias de lareira desse lugar pelo nome de o Cavaleiro Sem Cabeça de Sleepy Hollow.

Escrito por Washington Irving em 1820, este conto, aqui lançado pela Barba Negra, selo da Leya, como parte da coleção “Eternamente Clássicos”, narra as desventuras do pedagogo Ichabod Crane na pequena e sossegada Sleepy Hollow, com suas fazendas, suas tradicionais famílias produtoras de leite e as diversas histórias de fantasmas, contadas à frente da lareira e que tanto encantam ao pedagogo. Tenho que dizer que é bem diferente do filme de mesmo nome, dirigido por Tim Burton e estrelado por Johnny Depp. Os enredos são bem diferentes, então é quase como se ler uma outra história, com apenas alguns pontos em comum, já que Burton se baseou vagamente no conto de Irving.

Crane é um sujeito simpático, apesar de que toda sua desenvoltura deixe ressabiados os outros rapazes da região, que não tem seu desprendimento nas conversas ou seu talento na dança; que sofre por lecionar em um vilarejo onde não se dá muita importância ao conhecimento, uma vez que estão cercados por tradições rurais e superstições, ao ponto de ouvirem encantados Crane recitar trechos de certo livro que cuida de ciências mágicas. Tudo vai confortavelmente bem, na medida do possível – para economizar seu magro ordenado, Crane se hospeda na casa dos fazendeiros para cujos filhos dá aula, sendo obrigado a fazer uma espécie de rodízio a fim de não saturar a paciência do anfitrião; assim como acaba fazendo as refeições em casas alternadas – até que se vê atraído pela bela filha de um próspero fazendeiro, e vê ali uma oportunidade de se dar bem na vida.

Não se pode julgá-lo. Não é agradável ter um sub-emprego e ainda vagar por campos desertos e sombrios que gelam a alma, em busca de uma refeição que vá poupá-lo de gastar alguns míseros centavos; caso uma tênue esperança de mudar este quadro surja, é obrigatório que se agarre a dela. O que Crane não contava é que um arruaceiro do vilarejo, temido por todos, também estava de olho na moça. É neste ponto que a história se desenrola, no mais o autor nos brinda com uma bela descrição do lugar, seus costumes, assim como de Crane e sua vida ali. Vemos como as mulheres podem ser ardilosas, “A mulher é uma força!”, como bem disse Górki, e o autor ainda nos oferece uma forma inusitada de tratar com o cavaleiro sem cabeça, além de sutilmente sugerir finais alternativos para nosso “herói”.

Gosto muito desta edição, a capa, sem dúvida alguma é bastante chamativa, trabalho creditado à Retina 78, assim como o projeto gráfico. Em todo o livro belas ilustrações em preto e branco, de Walter Pax, que parecem ter sido feitas com carvão, muitas delas em página dupla, enriquecem a narrativa, apesar de em alguns momentos estarem fora do contexto, não se referindo a nenhuma das passagens próximas a ela, o que não vem a ser um problema de morte, mas que confunde.

É um bom livro, de uma tarde, para se ler sem muitas preocupações.

A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça (The Legend of Sleepy Hollow, 1820Tradução de Santiago Nazarian) Washington Irving – 74 páginas, ISBN 9788580442649, Editora Barba Negra / Leya.

{C+}

20 comentários:

  1. Eu adoro clássicos, mas nunca tinha ouvido falar deste. Agora me interessei e já está em minha lista.

    Estou seguindo aqui.

    Tudo Tem Refrão

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    1. Ágata, o livro é bem bacana, e rápido de ler, creio que gostará dele ;)

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    2. Muito obrigada, já anotei aqui para comprar, não conhecia o Eternamente Clássicos da Leya.

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  2. Adoro essa proposta da Leya/ Barba Negra de proporcionar ao público obras clássicas que todos conhecem e poucos leram como é o caso de A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça, esta edição está na minha lista faz tempo, super caprichada. Gostei muito do teu texto principalmente porque tu não caiu na armadilha de ficar fazendo comparações com o filme :)
    estrelinhas coloridas...

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    1. Mi, eu vi ele na Comix uma vez e fiquei louco, mas só consegui comprar agora. É uma leitura gostosa, rápida, e o trabalho da Barba Negra ficou muito bom ;)

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  3. Vi esse livro na Saraiva e fiquei em dúvida se a classificação dele estaria correta, porque dificilmente vou ler/assistir algo relacionado à terror e percebo o erro, porque se é um clássico infanto-juvenil, o terror não deve ser tão pavoroso! :) Mas me diga se ele vai me deixar tensa ou com medo! ;) Boa semana!! Beijus,

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    1. Luma, ele é bastante descritivo, mas não me deu medo não. Eu até o achei, em alguns momentos, bem-humorado, rs.

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  4. Fiquei puto porque quase comprei este livro na Bienal, o qual achei numa garimpagem no stand de uma das livrarias presentes, mas acabei me esquecendo do mesmo e só vim a me lembrar da minha intenção de início quando o evento já se fora.

    Surpreendi-me com o fato do enredo da obra original ser tão diferente do que apreciamos no filme do Burton, aliás um dos meus favoritos dele. Aliás, a própria caracterização das personagens parece-me ser totalmente outra, este Ichabod que tu descreveste na resenha é bem diverso do que a gente conhece interpretado pelo Johnny Depp, um detetive e não pedagogo, todo atrapalhado, tímido, uma espécie de pré-nerd, rs. Mas nem por isso arrefeceu meu interesse pelo livro, pelo contrário, desejo muito adquiri-la. Abração!

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    1. Jorge, o filme é vagamente baseado no livro - e em alguns pontos Burton conseguiu deixá-lo mais interessante, adicionando o detetive, por exemplo - mas devia tê-lo comprado. O livro é muito bom, apesar de muito curto ;)

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    2. Ah, esqueci de dizer que Crane é desenvolto se comparado aos outros "rapazes de Sleepy Hollow" ;)

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  5. Sou fã do filme homônimo do Tim Burton, mas não sabia que a história original era tão diferente (muito menos que Ichabod Crane era um pedagogo)!

    Muito boa sua resenha, como sempre, só fiquei curiosa sobre como seriam as ilustrações que você citou. ^^

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    1. Jéssica, as ilustrações são muit onitas - sombrias, como o livro pede ;) - até tentei tirar uma foto, mas sou um desastre com uma câmera na mão, rsrs.

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  6. Luciano,

    Essa capa é muito bonita mesmo. Acho que vi uma parecida na revista Avon desse mÊs, no livro O Mágico de Oz...
    Como a Mi disse, é legal a proposta de publicar clássico que todo mundo ouviu falar mas poucos leram.

    =)

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    1. Joelma, é perfeito isso, pois dá a oportundade de um número maior de pessoas terem acesso a ele ;)

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  7. Eu jurava que tinha comentado essa resenha! Sou doida para comprar esses livros, não só pelo texto, mas pelo trabalho gráfico, quando tiver inspirada (ou afim de brigar com alguém) vou encomendar pelo Submarino, sempre tem promoções por lá.

    Ah, essa frase do Górki me lembrou uma de Nietzsche: "... a mulher completa arrebenta..." e as suas observações me lembraram Kierkegaard: "Um homem nunca poderá ser tão cruel como uma mulher... Se for necessário dar um exemplo de um principio natural que não conhece limites ao seu impiedoso rigor, encontrá-lo-emos num ser virginal."

    Eu particularmente sou arretada com isso, acho que a humanidade é dada a perversidade e não a mulher... Acho que os homens deviam superar o medo primitivo que eles sentem da mulher e sim, eu divaguei nesse comentário... e olha que o foco de hoje é o bookcrossing rsrs

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  8. Estou em dúvida entre esse e o "Lenda do Cavaleiro sem Cabeça e Rip Van Winkle", poderia me ajudar?

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    1. Acho que ambos valem a pena - apesar de ainda não ter lido "Rip Van Winkle"....

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Oscar