2 de março de 2015

A Garota que Tinha Medo, de Breno Melo [Resenha #207]

A Garota que tinha medo


Sinopse: A Garota que Tinha Medo - Marina é uma jovem que faz tratamento para a síndrome do pânico. Às voltas com o ingresso na universidade, um novo romance e novas experiências, Marina tem seu primeiro ataque de pânico. Sua vida vira de cabeça para baixo no momento mais inapropriado possível e então psiquiatras e psicólogos entram em cena. Acompanhamos suas idas ao psiquiatra e ao psicólogo, o tratamento farmacológico e a psicoterapia. Ao mesmo tempo, conhecemos detalhes de sua vida amorosa e sexual, universitária e profissional, social e familiar na medida em que elas são marcadas pela síndrome. Um tema atual. Uma excelente obra tanto para conhecimento do quadro clínico como entretenimento, narrada com maestria e de uma sensibilidade notável.


Meu primeiro contato com o livro se deu através da resenha que a Alessandra Tapias publicou em seu blog, o Tô Pensando em Ler. Lá comentei o quanto o tema me era caro por ter pessoas bastante próximas a mim que já sofreram com isso, e isso, de certa forma, atraiu a atenção do autor, Breno Melo, que entrou em contato perguntando se gostaria de ler o livro. Bom, é claro que sim!

O livro, narrado em primeira pessoa, conta a história de Marina, uma adolescente que tinha uma vida plenamente normal até que tem seu primeiro ataque de pânico. A partir daí, vamos acompanhando a luta dela contra um medo que ela não sabe de onde vem, mas que deixa a nítida sensação de que ela vai morrer, e o quanto isso limita sua vida, além das reações das pessoas que a cercam.

A primeira coisa que fica clara é o quanto a situação a tira do eixo, pois ela não sabe o que está acontecendo e as pessoas ao seu redor não sabem como agir. Essa confusão é bastante comum nos primeiros ataques, tudo é muito desconhecido, como é normal também que se busque por problemas físicos que expliquem as crises. Até o diagnóstico de distúrbio mental o caminho é longo e bastante sofrido.

Gostei da forma como o autor tratou do assunto. Sendo bastante direto ao descrever os sintomas e em especial as crises de pânico de Marina, ele ganha a cumplicidade do leitor que sabe que está vivenciando algo que foi muito doloroso para a protagonista, e ele não capitaliza o sofrimento dela, e isso faz com que o livro ganhe muito, ficando com um tom mais sério que um típico sick-lit.

Outro ponto a favor é que Marina por si só é um personagem interessante. Amante de fotografia, sonha ser jornalista e tem um humor afinado que ela mesmo demora a reconhecer – geralmente ela se define como “sem graça” – e é extremamente inteligente. Eu sou um leitor de ação, normalmente monólogos me fazem ou viajar ou perder a paciência, mas com o livro foi exatamente o contrário, pois é quando Marina fala consigo mesma, avalia sua situação e conta sua história para nós que ela se mostra mais interessante, múltipla, e toda a confusão pela qual ela passa ganha cor e forma.

A síndrome do pânico é uma doença terrível. Como disse no começo dessa resenha, já vivenciei o problema através de pessoas próximas, e o sentimento que fica em quem vê alguém passando por isso é de impotência. É incrível como é forte essa sensação, o quanto chega a ser torturante perceber ao mesmo tempo que não se pode fazer nada e que o que a pessoa está sentindo é mil vezes pior.

Neste ponto o livro é bastante esclarecedor. Ele não tem, acredito, a intenção de ser didático, mas tudo pelo que passa Marina é narrado de forma tão sensata, que é inegável que o livro pode vir a ser uma boa fonte de informação para quem deseja ler algo ficcional sobre o problema.

A leitura, por mais contraditório que possa soar, flui bem ao mesmo tempo que é incômoda em alguns momentos. Me explico: o autor é um narrador extremamente competente, criou situações e personagens possíveis – em nenhum momento duvidamos da veracidade deles – que possibilita uma leitura bastante fluída; mas algumas das passagens são bastante espinhosas e me foram difíceis de ler – que fique claro, mérito do autor!, a intenção é justamente essa, mostrar ao leitor o que passa quem sofre de síndrome do pânico.

Gostei bastante. Já esperava um teor mais tenso do livro, mas ao final fui surpreendido por um livro muito bem escrito, que não deixa pontas soltas e que não tem medo de colocar sob a luz um problema bastante incompreendido – de problemas espirituais à pura safadeza, quem sofre já deve ter ouvido alguns desses absurdos – e fazer isso com uma personagem que pensa por si própria e não tem medo de questionar. Vale muito a pena a leitura.

 

A Garota Que Tinha Medo, de Breno Melo (2014) – 280 páginas, ISBN 9789895123315, Chiado Editora.

{ A }

 

*Livro cedido pelo autor

5 comentários:

  1. Perfeito!!
    Se o Breno não fosse homem, rsrs, eu diria que esse livro é autobiográfico de tão perfeito que é.

    Sua resenha ficou tão maravilhosa!! Tão intensa!! Que bom que gostou do livro, porque eu gostei bastante.

    Tem uma coisa que eu não disse na resenha, mas depois de um tempo eu fiquei pensando nisso. Algumas vezes ele narra algo, tipo assim, a personagem está com sede, e eu levanto pra beber água. Ele descreve tão bem que eu sentia como se eu fosse ela.
    E você falou muito bem sobre isso.
    Amei a resenha ♥

    Bjks

    Lelê - http://topensandoemler.blogspot.com.br/

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  2. Estranho mesmo eu me deparar com essa resenha aqui. Descobri ter o ataque de pânico faz uns 2 meses, depois de tudo o que passei ano passado com a minha dor que não sarava, acho que meu psicológico não ficou muito forte haha. Sim, é horrível ter medo de algo que você não sabe bem o que é, ficar com falta de ar e tremer involuntariamente. As pessoas próximas a mim sempre me dizem: mas meu Deus, como é que você não sabe porque ta assim? Alguma coisa tem que ter. E eu vasculho minha mente e não acho.

    Muito incrível essa história da Marina. Acho que mais pessoas deveriam ler pra entender o grande problema por volta disso. Essa é uma doença do nosso século. Muitas pessoas tem desenvolvido essa ansiedade.

    Mais uma vez uma ótima resenha. Beijos. Tudo Tem Refrão

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  3. Oie,
    Nunca li um livro com esse tema, mas pelas suas palavras me pareceu um livro bem interessante, ainda mais para quem não conhece nada do assunto. Bela resenha...bjos Elis!!

    http://amagiareal.blogspot.com.br/

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  4. Adorei a leitura e a história de Marina =)
    Li o livro em dois dias

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  5. Fico contente que sua resenha seja tão positiva. Acho que o principal em livros que retratam doenças é que a condição seja respeitada, e não tratada de forma leviana. Também já tive uma certa experiência com a doença e concordo que a principal sensação é a de impotência, então, parabéns ao autor por um livro sensível, e a você por uma resenha tão fantástica, como sempre =)

    Abraços!

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