29 de junho de 2012

Ladrão de Olhos – As Aventuras de Peter Nimble [Resenha #056]

Ladrão de Olhos

 

 

Sinopse: O que o destino reserva a uma criança cega e órfã, que usa seus dotes para roubar todo tipo de objeto de qualquer tipo de pessoa? Uma criança que dorme em um porão escuro e frio durante o dia e é obrigada a sair furtivamente à noite para cometer seus delitos e, assim, sobreviver? O que o destino reserva a um garoto de dez anos que já é considerado o maior ladrão que já nasceu? O destino, caro leitor, reserva a essa pobre criatura três olhos mágicos, que irão levá-lo a uma viagem inesquecível, na qual inimigos e estranhas criaturas estarão à espreita em lugares completamente deslumbrantes e magníficos! O destino lhe reserva um amigo que estará por perto sempre que precisar e aventuras que farão de Peter Nimble, o órfão, o cego, o pobre coitado, um dos maiores heróis que já existiu!

Nunca havia pensado em um protagonista cego para um livro infantojuvenil. Existe um certo tabu sobre a cegueira, poucos se sentem confortáveis em mesmo apenas pensar sobre ela, então um livro com um herói órfão, pobre, cego e escravizado por um adulto inescrupuloso era algo difícil de imaginar. Ainda bem que me deparei com Ladrão de Olhos, primeiro romance de Jonathan Auxier. Com os direitos já vendidos para o cinema e algumas comparações com Harry Potter (não na estória em si, mas no fascínio que ela causa), Peter Nimble tem tudo para se tornar um personagem memorável.

Dono de habilidades únicas – não podendo enxergar, o garoto desenvolvera ao extremo suas aptidões sensoriais, se relacionando com o mundo ao seu redor através do olfato, do tato, e da audição – Peter pode identificar a idade de uma pessoa, o tipo de calçado ou roupa que ela está usando, a grande variedade de aromas trazidos com o vento e, mesmo, sentir onde há ou não luz baseado no calor emitido pela radiação natural que delas emana, assim como abrir qualquer tipo de cadeado com seus dedos finíssimos. Assim, consegue andar pelas ruas da cidade onde mora, se esgueirar dentro das casas dos notáveis moradores e mesmo de bancos, e roubar o suficiente para fazer com que Sr. Seamus, um aproveitador que o “adotara”, visando apenas utilizá-lo como ladrão particular, se sinta satisfeito e lhe dê um pouco de comida ao invés de safanões. É assim todos os dias, até que encontra um estranho vendedor e rouba dele algo ainda mais estranho.

Pode-se imaginar que a vida de Peter não era nada fácil. Menino de dez anos, sem uma família, um amigo, e sem esperança alguma, ele é o tipo perfeito para se encontrar com estranhas figuras, objetos mágicos, uma terra distante e recompensas bem diferentes das esperadas, e é isso que o autor nos oferece em seu livro de estreia.

Hábil contador de histórias, Auxier consegue atrair para seu texto um público mais amplo que aquele ao qual o livro, originalmente, é destinado. Em algumas de minhas últimas leituras de livros infantojuvenis, e até mesmo de jovens-adultos, senti certo incômodo e uma sensação constante de estar deslocado ao ler os acontecimentos narrados, como se não mais – com meus vinte e seis anos – fizesse parte daquele mundo ou que não pudesse compreendê-lo à distância. Não senti isso em Ladrão de Olhos. O narrador estreita os laços com o leitor, conversando com ele de modo a aparentar uma proximidade maior entre ambos, do tipo de conversa que se tem com um amigo de longa data.

E o livro mantém uma constante agradável: dividido em três partes, cada uma representando uma das cores dos olhos mágicos que Peter rouba – ouro, ônix e esmeralda; – a leitura mantém-se fluída em todas elas, com elementos e mistérios em quantidade suficiente e muito bem utilizados, fazendo com que o interesse pelos acontecimentos cresça a cada página, rumo ao desfecho final.

Mudando um pouco o foco – e sei que não sou um bom exemplo para comparações, pois sou coração mole confesso – considero que o livro requer uma certa maturidade do jovem leitor, pois algumas passagens me deram aquela sensação de agulha de tricô sendo enfiada no peito. Conhecem? O modo como Peter perdeu os olhos é uma delas e talvez um dos momentos mais fortes da narrativa – e eles acontecem com alguma frequência, mas nunca de forma gratuita. Não acho que seja um spoiler, pois é dito bem no começo do livro: ele fora encontrado boiando em um cesto, na companhia de um corvo, que bicara seus olhos. Não digo que é “forte” por haver sangue, pânico e destruição – ao menos não nesta passagem – mas sim por contrastar com o tom narrativo de Auxier, que até certo ponto é alegre e positivista dada as condições de Peter.

Quase nunca comento sobre diagramação e afins, mas a de Ladrão de Olhos merece destaque. Cada abertura de capítulo contém uma ilustração que me fizeram relembrar os livros dos tempos de infância. São ilustrações caprichadas, que mostram um pouco do que será abordado no capítulo, e te faz querer se apressar para saber logo o que é. Outro ponto interessante é que as páginas são tingidas – será a palavra certa? – em tons de negro, sendo mais claras no centro e gradativamente mais escuras conforme vai em direção às bordas, sem, em nenhum momento, atrapalhar a leitura. Ponto positivo também para a encadernação: apesar de o livro ser grossinho ela não quebra.

Já disse algumas vezes que literatura infantojuvenil me atrai. Se bem escrita acaba por me fascinar. Peter Nimble é um personagem adorável, não pensem nem por um momento que sua deficiência faz dele um estorvo ou alguém que passe os dias reclamando sua má sorte. Ao contrário. Poucos personagens são tão dispostos fazer o que é certo e possuem um coração tão bom. Só me resta esperar por novas aventuras.

Ladrão de Olhos – As Aventuras de Peter Nimble (Peter Nimble and his Fantastic Eyes, 2011Tradução de Alice Klesck, 2012) Jonathan Auxier – 424 páginas, ISBN 9788580442700, Editora LeYa [Comprar no Submarino]

{B+}

14 comentários:

  1. Ameii, adoro livros com muita aventura.

    Wanessa

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    1. Wanessa, você já recebeu o kit de "Estilhaça-me" que ganhou no sorteio? Abraços.

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  2. Fiquei até arrepiada coma parte dos olhos bicados por corvo e fascinada pela habilidades do garoto.

    http://relembrandosonhos.blogspot.com.br

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  3. E eu nunca teria imaginado que um livro com esse título seria direcionado para o público infanto-juvenil. Realmente, depois de uma certa idade é um pouco estranho ler certos livros direcionados para essa faixa etária; é preciso ser um narrador bem habilidoso para conseguir interessar ao mesmo tempo o leitor adulto, mas muitas vezes acontece essa mágica, então a leitura torna-se um prazer para pessoas de oito aos oitenta.

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    1. Cris, um bom narrador faz toda a diferença nestes momentos, e Auxier fez um bom trabalho, ocnsegui lê-lo sem problemas. Algumas passagens são mais fortes e estranhei um pouco, mas nada que atrapalhe.

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  4. Opa, esse entrou para a lista! Eu amo fantasia então esse tipo de narrativa me atrai de cara, embora fique pensando que se você que não me parece uma manteiga derretida chegou a se emocionar é possível que eu chegue a me derreter como manteiga no sol lendo uma história dessas!!!

    Cheros.

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    1. Pandora, o livro te pega no contrapé as vezes, e é um pouco difícil se segurar, pois te surpreende, por ser um livro infantojuvenil. Mas o todo é otimista, Peter não se faz de coitado para se aproveitar de sua condição, o que ameniza o tom.

      Beijos.

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  5. Neste momento EU PRECISO desse livro! Posso estar enganada, mas tem um Q de Hugo Cabret nesse livro, o que significa que vou me apaixonar. Já está na wishlist!

    Abraços

    Lu Tazinazzo
    http://aceitaumleite.blogspot.com.br

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    1. Lu, tem, em parte, a mesma atmosfera, trás sentimentos semelhantes. É tão bom quanto ;)

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  6. Também me lembrou do Cabret. Se for parecido vou adorar ;)

    Ssi

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  7. Estou de saída do trabalho e termino de ler em casa! Muito interessante!

    Até já!

    Beijos

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  8. Luciano
    Impressionante a história desse livro. Tipo de leitura que me rende e esses detalhes sobre a perda dos olhos deve partir o coração.
    Impossível não querer ler! A leya comm mais uma história de arrepiar!

    Um bom dia!

    Beijos

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    1. É um livro excelente, tenho certeza de que vais gostar, ele te transporta numa grande aventura, que é tão especial por Peter ser um personagem muito especial, com um coração enorme.

      Beijos ;)

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