11 de janeiro de 2013

Condenáveis [Resenha #098]

Condenáveis

 

 

 

Sinopse: Ele descobriu que o pai havia sido preso através de um programa de TV. No início, sentiu culpa e vergonha por acreditar ser filho de um criminoso. Depois, raiva e aversão. Tudo o que queria era distância. Policial civil conhecido pelo combate ao tráfico de drogas, o pai foi acusado de venda de armas e repasse de informações sigilosas a traficantes procurados no Rio de Janeiro. Era a chamada Operação Guilhotina, que ocupou os noticiários nacionais em 2011. Estudante de Jornalismo, o filho tinha pânico que os colegas de trabalho descobrissem sua ascendência. Nunca pensou em visitar o pai na cadeia ou em telefonar para ele após sua libertação. O filho condenou o pai e, neste livro, explica o porquê.

É difícil falar de um livro que trata de relações familiares. Quando elas não são tão saudáveis quanto desejável, pior ainda. E se baseadas em uma história real, ou, mais que isso, se são um relato de algo que realmente aconteceu?

Sinceramente me sinto encurralado. Não há como – eu ao menos não vejo saída – falar sobre Condenáveis sem julgar seus personagens, e, mesmo que o autor, Leonardo Torres, nos abra esta janela ao narrar sua história de forma tão sincera, me sinto um pouco desconfortável, mas vamos lá.

Meu pai era bipolar. Quem já conviveu com alguém que tem este transtorno sabe como as coisas podem ficar difíceis de um minuto para o outro: de manhã é um bom dia, a noite é um FORAAAAAAAAAAAAAAA!. Ou quase isso. Mas meu pai era uma pessoa sensacional quando estava no “modo bom”, e a gente de casa percebia isso no olhar, na linguagem corporal, e em momento algum – mesmo quando no “modo nem tão bom assim” – se duvidava do quanto ele amava sua família e de que era capaz de fazer tudo por ela.

Daí eu me deparo com o livro e vendo como tudo lá é muito fora do esquadro – ou do esquadro que eu imagino para o mundo, em parte baseado no meu próprio. Um pai que aparece sem se mostrar presente; e um filho ressentido de todas as maneiras e que, dá pra perceber – e mesmo que diga o contrário – sente falta do convívio. E apesar do meu estranhamento, é preciso reconhecer que esses desencontros familiares acontecem com uma frequência bem maior do que se imagina, e o que faz deste algo tão surpreendente é o tom franco que o autor assume ao narrá-lo.

E não o culpo – ele, o filho. O pai não sei, o livro trás só um lado da história.

Se meu pai me ignorasse ou não se mostrasse tão disposto a “ser pai” eu faria o mesmo, mas é melhor parar de falar de mim. E da família do autor. De um jeito ou de outro conseguiram o que queriam, mesmo que, talvez, nenhuma das partes tenha terminado satisfeita.

Falando do texto, o autor tem talento pra narrativa. Apesar de durante boa parte dele demonstrar uma certa necessidade de aceitação e consentimento do leitor, como se se justificasse pelos atos tomados, o texto flui muito bem, e, mesmo que de denso, não pesa a leitura, deixando-a arrastada. Você começa, termina e entende. Sem problemas.

E é isto que faz do livro uma boa leitura. A história narrada ali é séria, real, e o leitor vai seguindo pelas lembranças de Leonardo, que mesmo absurdamente íntimas foram compartilhadas. É preciso, reconheço, muita coragem. Mas, mais que isso, é preciso talento para fazer com que o leitor não se canse e abandone o livro antes da página cinco. Isso tende a acontecer com livros pessoais demais. Não é fácil manter o público interessado.

No final fica aquela sensação de assunto inacabado ou mal resolvido. Isso sempre acontece quando nos deparamos com  as coisas como elas são, e, assim sendo, percebemos o quanto são distintas do que imaginamos. Daí só nos resta pensar.

 

Condenáveis, de Leonardo Torres (2012) 145 páginas. ISBN 9788591354313. Publicação independente

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11 comentários:

  1. Eu li o livro do Leonardo e achei o máximo. E apesar da pessoalidade, o leitor se sente bastante a vontade mesmo. Enfim, ótimo!

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    1. Lucas, o livro é bastante pessoal, e, justamente por isso, não me senti à vontade o tempo todo não, às vezes surgia um certo constrangimento. Mas, concordo, é um ótimo livro.

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  2. {Legal, adoro quando o blogger apaga o comentário enorme que fiz antes '_'}
    Enfim, estou com esse ebook há um tempinho, mas não tinha tido tempo ainda para ler - agora já está nas minhas lista de leituras de férias. É complicadissimo resenhar livros que sabemos que se baseiam na vida real do autor, já que, ao julgarmos os personagens, estamos julgando pessoas de carne e osso indiretamente...

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    1. Exatamente. É difícil falar quando, ao fazê-lo, você estará falando de alguém que existe de verdade. É bem complicado.

      Ah, o Blogger adora sacanear, eu já tô cabrero, e vivo dando Ctrl+C, rs.

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  3. Oi Luciano!
    Adorei sua resenha, pois você contou como o livro te tocou e como ele se relaciona com sua própria história... É interessante quando a gente se identifica com um livro.
    Parece ser uma ótima leitura.

    Beijos,
    Sora * Meu Jardim de Livros

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    1. Sora, às vezes não consigo me segurar, e acabo trazendo a iscussão "pra mim". Fico feliz que tenha agradado ;)

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  4. Eu costumo dizer, e não é novidade para você, que meu pai é o Hulk sempre oscilando... Nunca se sabe quando ele vai passar de preto para verde... rsrs... Mas eu também não sei o que faria se ele fosse o tipo que não se importa com nada, que não tivesse disposto a "ser pai"... Histórias de pais e filhos assim nos deixam encurralados entre julgamentos e entendimentos e ai é fazer como você disse na conclusão da resenha: "Daí só nos resta pensar."

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    1. Pois é, para o bem ou para o mal, eu prefiro o meu ranzinza a um que se anula. Mas é complicado, a discussão é pessoal ao extremo, e só nos resta mesmo é pensar sobre.

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  5. Oi Luciano!
    A temática desse livro é bem intensa,um livro que parece tocar de forma surpreendente aqueles que o lerem,sua resenha ficou como sempre muito bem elaborada.A única coisa que não me agradou muito foi a capa do livro,poderia ter sido melhor explorada.
    Abraço!

    Bruno
    http://oexploradorcultural.blogspot.com

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    1. Bruno, é um livro forte, que mexe e expõe mesmo. Também acho que a capa não condiz muito com o livro em si.

      Abraços.

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  6. Falando relacionamento de pais e filhos é semjpre bom ter um pai que seja chato, implicante,mas hoje vejo com outros olhos. Estar sempre nos vigiando, acompanhando nssos passos é uma forma de se preocupar, de estar presente em nossas vidas. É essa imagem de saudades, de conselheiro, de segurança que sinto falta e sem querer acabo me apoiando no meu companheiro.
    Imagino a dificuldade em falar sobre relações familiares, mas também não deve ter sido fácil para Leonardo Torres escrevê-la e pela que nos relata em sua resenha a leitura é boa. No momentos fugindo de assuntos fortes.
    Beijos

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