28 de janeiro de 2013

O Pesadelo [Resenha #103]

O PesadeloSinopse: Após conquistar os leitores em O hipnotista, o detetive Joona Linna está de volta em O pesadelo. Best-seller internacional, o thriller policial de Lars Kepler foi aclamado por público e crítica em dezenas de países. Agora, o autor nos deixa sem fôlego com um novo quebra-cabeça, cujas peças o detetive mais carismático, intuitivo e obstinado da Suécia precisa encaixar. Tudo começa quando a polícia descobre o corpo de uma jovem dentro uma lancha à deriva no arquipélago de Estocolmo. Seus pulmões estão cheios d’água e os médicos legistas afirmam que ela morreu afogada. No entanto, o barco está em perfeito estado e o corpo e as roupas da mulher estão secos. No dia seguinte, um alto funcionário do governo sueco aparece enforcado em seu apartamento. Ele flutua no ar enquanto uma enigmática música de violino ressoa por todo o ambiente. Tudo indica que foi suicídio, mas o salão tem pé-direito alto e não há nenhum móvel em volta no qual ele possa ter subido. Encarregado de desvendar os dois mistérios, o detetive Joona Linna tenta estabelecer um vínculo entre esses acontecimentos que, à primeira vista, não têm relação. Ao descrever o curso vertiginoso de eventos para os quais a lógica é um mero prelúdio, o mais assustador em O pesadelo não são seus crimes horripilantes, mas a psicologia obscura de seus personagens, que mostram como somos todos cegos a nossas próprias motivações.

Minha primeira surpresa com “O Pesadelo” foi descobrir que, na verdade, Lars Kepler é o pseudônimo do casal Alexandra Coelho Ahndoril e Alexander Ahndoril. Interessante isso, um casal dividir a escrita e, conjuntamente, conseguir dar vida a personagens tão marcantes. Se tenho um pé atrás com livros escritos à quatro mãos, aqui tive que me render ao talento dos escritores, que entregou ao seu público um livro de muitas formas diferente do que se vê no mercado de romances policiais.

Em “O Pesadelo”, a polícia encontra o corpo de uma jovem morta em um barco e ao que tudo indica ela foi afogada, mas, logo a polícia percebe, seu corpo e roupas não apresentam sinais de água do mar. Um dia depois, um importante funcionário público, responsável por autorizar as exportações de armas da Suécia é encontrado morto, no que aparenta ser um suicídio.

Não demora muito para que a polícia – e em especial Joona Lina, o principal personagem criado pelo autor, Lars Kepler – relacione as mortes, e se ver envolto em um mistério de grandes proporções, tendo de se desdobrar para capturar o assassino da mulher no barco que, ao que tudo indica, agora está caçando a irmã da vítima.

A ação do livro é bastante rápida, principalmente graças aos capítulos curtos que dinamizam a ação, e ao autor não perder tempo com devaneios. Tudo é muito rápido, os acontecimentos se sucedem sem que dê tempo para o leitor respirar, e em livros policiais isto é bom, e o livro te prende de uma forma que é quase impossível larga-lo e não querer saber o que se passa no capítulo seguinte.

Mas nem por isso os personagens são mal desenvolvidos. Ao contrário, o livro tem uma coleção de sujeitos estranhos, que vão desde um fracassado – e psicótico – ex-apresentador de tv que vê na vida um grande jogo à uma empregada que não se mostra muito abalada com o suicídio do patrão, dizendo simplesmente que não falaram sobre o fato por seu trabalho não lhe exigir discutir assuntos pessoais com o contratante. E, claro, passam pelo assassino, que aqui tem um jeitão Jason Vorhees de ser: sempre perseguindo às vítimas onde quer que vão, sem aparentemente nunca perder o rastro, e estando sempre um passo à frente. Frio, rápido e bem treinado, nem mesmo Joona é páreo para ele durante um breve encontro, que, ao menos, serve para o detetive definir o assassino como profissional.

E chegamos à Joona Lina, o detetive com nome de mulher. Ou ao menos assim parece para mim, acostumado à forma latina dos nomes, e esta é uma das dificuldades do livro: você não consegue guardar bem nomes com os quais não tem uma certa afinidade – por isso romances russos e orientais tendem a ser mais complicados de se guardar os nomes dos personagens – então demora um certo tempo até se adaptar a eles.

Mas Joona é brilhante. Ele é impulsivo, sempre sabe o que é certo fazer, mas há algo em suas atitudes que não fazem dele alguém a se detestar, mas sim a seguir e, onde quer que ele esteja, sua presença é sempre sentida e respeitada. Mesmo com todas estas qualidades ele não é chato. Poirot, Maigret e Holmes são chatos às vezes, e Marlowe é irritantemente seguro de si. Joona não. Mesmo sabendo relacionar fatos e se lembrar de detalhes mínimos de cenas de crimes, ele é excelente também em combate, o que o coloca em um grupo diferente de detetives. Você não vê Poirot trocando sopapos por aí. Já Joona, ao mesmo tempo em que deduz algo corretamente consegue ser bom também nos momentos de ação.

Mas, como todo bom personagem de romance policial, ele tem alguns problemas, como um relacionamento que não consegue desenvolver com Disa, e uma enxaqueca tão forte que o faz perder os sentidos – que eu acho, e espero, tenha sido originada na primeira aventura do detetive, “O Hipnotista”, que agora quero muito ler; assim como uma mensagem que recebe de uma senhora, lá no final do livro, e que me deixou curioso além do normal.

E não posso me esquecer de Saga, uma detetive que trabalha com Joona neste caso e que tenta se impor por ser uma mulher com ares élficos em um departamento de polícia, se sentindo constantemente diminuída pelo sentimento de proteção que seus colegas têm para com ela. Gostei dela, ela tem a boca suja que imagino que um policial deve ter para dar vazão à adrenalina comum ao serviço, e também é disposta a todos os tipos de missões, assim como Joona.

O livro não é o primeiro de uma série, mas dá pra ler tranquilo, lembrando que sempre se perde um pouco nas relações que envolvem os personagens, mas nada que mine a experiência de leitura.

Mas lendo o livro achei o título inadequado. O pesadelo só tem uma participação decisiva já adiante no livro, e a explicação dada a ele quebra um pouco o tom realista que o autor dá a obra, com informações sobre órgãos e decisões legais que só podemos adivinhar serem verdadeiras. Mas, sendo ou não, a parte do pesadelo – que não posso dizer o que é por ser spoiler – destoa do restante, e se outra explicação fosse dada faria muito mais sentido com o livro como um todo.

No final é um livro acima da média, que foge do padrão que se costuma ver nos romances policiais atuais. Aqui, o crime cometido chega a ser obliterado pelo tamanho dos personagens e a construção que Kepler dá a eles. É raro isso, em certo momento Joona me interessou mais que o próprio crime que investigava. Mas, de certa forma, isto é bom para a longevidade da série, que, aqui, já ganhou mais um fã.

 

O Pesadelo, de Lars Kepler (Paganinikontraktet, 2010 Tradução de Alexandre Martins [a partir da edição britânica: The Nightmare], 2012) 448 páginas, ISBN 9788580572537,  Editora Intrínseca. [Comprar no Submarino]

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10 comentários:

  1. Olá :)
    Adoro livros policiais e confesso que fiquei intrigada com esse livro. Já vi ele em alguma livraria, mas nunca havia me interessado. Parece ser um livro ame ou odeie...

    Beijo, Caroline
    Another Words
    http://anothersimplewords.blogspot.com.br/

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    1. Caroline, este é um bom representante do gênero ;) vale a pena ler.

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  2. Interessante. Romance policial é um dos gêneros que mais gosto. O Pesadelo parece ser um bom exemplar, já havia lido algumas recomendações positivas sobre O Hipnotista, que já aguarda na fila para ser lido. Recentemento tive o prazer de ler um livro (Feche Bem os Olhos) que me despertou um sentimento parecido com o que você relatou em relação aos personagens, o fato destes serem capazes de eclipsarem o crime. Como você bem colocou é um elemento raro, mas, felizmente, eles existem. Portanto, O Pesadelo já está na lista.

    Abraços
    Juan - sempre-lendo.blogspot.com.br/

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    1. Juan, me sinto muito à vontade lendo romances policiais, e "O Pesadelo" me proporcinou uma experiência única, agora quero muito ler "O Hipnotista".

      Não conhecia o livro que mencionou, vou adicioná-lo à lista ;)

      Grande abraço.

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  3. Mesmo lendo diversas resenhas positivas, não sinto muita vontade de ler essa série. Na verdade, ultimamente não tenho tido vontade de ler romances policiais, estou meio esgotada do consumo exagerado desse gênero, mas não duvido que O Pesadelo seja uma leitura válida, e pretendo lê-lo no futuro.

    Abração.

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    1. Lu, vale muito à pena, é interessante ler um romance policial que se passe fora do eixo Inglaterra-EUA, os personagens soam diferentes, os cenários. Gostei muito.

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  4. Li um tanto surpreso sua resenha, há um pouco mais de uma semana li uma resenha deste livro e era bem negativa. Porém, aquilo não tirou minha vontade de ler, sou fã de romance policial. E agora lendo sua resenha é que me dar vontade mesmo de ler.
    E outra um livro escrito por quatro mãos e recebendo um 'A' é porque é realmente bom.

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  5. Achei esse livro terrível! Mal elaborado, personagens clichês, com um protagonista que chega a umas conclusões bem óbvias.

    Abs,

    Gleice
    www.murmuriospessoais.com

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  6. Não gostei tanto assim do livro... Mas enfim, achei super interessante o título em sueco - a adaptação para o português é coerente, mas acho que "O contrato paganini" seria mais instigante...

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  7. Luciano
    Gosto muito de lerromances policiais evejo que gostou e at'e o insentivou a ler outra obra do autor.
    Lembrei do Isaac Bell quando fez os comparativos de detetives tão famosos.

    Bjs

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Oscar