7 de julho de 2014

Tropas Estelares, de Robert A. Heinlein [Resenha #176] ATUALIZADO

Tropas Estelares - Texto


Sinopse: Tropas Estelares [Hugo Winner Award de 1960] é um dos mais polêmicos livros da história da Ficção Científica. Mostra a Terra, em um futuro não muito distante, vivendo sob uma Federação interplanetária, onde só exerce direito de voto (e adquire cidadania plena) quem serve às Forças Armadas. A história mostra o treinamento e preparação de jovens soldados (com um realismo impressionante) até que estoura a guerra contra os temíveis e misteriosos Insectóides, poderosos alienígenas aracnídeos que podem destruir o sonho terrestre de expansão no universo.


Não tenho como começar essa resenha sem citar dois escritores que já afirmaram serem influenciados pela obra de Robert A Heinlein: George R.R. Martin e Neil Gaiman. Tá bom ou é pouco?

Heinlein é um dos grandes mestres da ficção científica,  diversas vezes ganhador do Hugo Awards, um dos mais importantes prêmios para obras do gênero, uma delas, em 1960 pelo Tropas Estelares, que havia sido originalmente serializado um ano antes, na revista The Magazine of Fantasy & Science Fiction.

Meu primeiro contato com o Tropas foi com o filme de 1997 dirigido por Paul Verhoeven, mesmo diretor de Robocop, e que se não agradou tanto aos fãs do livro, ao menos conseguiu imprimir em mim a curiosidade de buscar pelo autor. Demorei um bom tempo para fazê-lo, e me arrependo um pouco disso, pois o livro me proporcionou uma das melhores leituras que fiz na vida.

No livro, em um futuro próximo, as nações como as conhecemos não existem mais – ao menos em sua representatividade geopolítica – , e uma grande federação governa não só a Terra como também os planetas colonizados. Há paz, há prosperidade, os impostos são baixos, assim como a violência, mas apenas pode votar e exercer a cidadania plena quem se alista nas forças armadas.

Até que a raça humana em seu desejo de expansão dos seus domínios chega a Klendathu, um planeta onde vive uma raça alienígena com formato insetóide, mas que se mostram inteligentes, organizados e perigosos. O homem dá o primeiro tiro, e assim começa a guerra.

Os historiadores parecem não conseguir concordar em se devem chamá-la "A Terceira Guerra Espacial" (ou a "Quarta") ou "A Primeira Guerra Interestelar". Nós a chamamos simplesmente de "A Guerra dos Insetóides", se é que a chamamos de algo (…)

Ao contrário do que poderia esperar a raça humana, mesmo se sentindo superior e portando exoesqueletos que lhes davam, em combate, maior resistência, força, acuidade, velocidade e muitos outros atributos, a guerra se mostra cruel e difícil de vencer, com os insetos numa proporção de centenas de milhares para cada combatente humano. Até que eles, os insetos, com o auxílio de uma segunda raça alienígena, dessa vez humanoides, descobrem onde fica a Terra, e fulminam Buenos Aires.

Por essa época, Johnny Rico, nosso protagonista, um jovem de família abastada que decide se alistar nas forças armadas mesmo contra a vontade de sua família, já está em serviço, tem esculpido em si um afiado senso de dever, mesmo que, tempos depois, reconheça que não sabe com certeza as razões pelas quais se alistou.

Apesar disso eu tinha me alistado para conseguir o voto.
Tinha?
Eu tinha me importado com votar? Não, era o prestígio, o orgulho, o status... de ser um cidadão.
Era?
Nem que eu precisasse disso pra salvar minha vida, eu não poderia lembrar por que eu tinha me alistado

O livro é narrado em primeira pessoa, com Rico relatando as durezas do treinamento militar e do desespero de uma guerra que ele percebe cada vez mais como perdida, apesar do que toda a “desinformação” da propaganda de guerra do governo queira fazer a população acreditar,  além de traçar linhas gerais que atualizam o leitor quanto à criação do sistema de governo, da Federação Galática, dos primórdios da Guerra, o que é um grande mérito da narrativa do autor: falar de forma clara sobre assuntos complicados em um livro curto, de forma a deixar seu leitor a par de tudo o que acontece no universo do livro, e a tradução acompanha isso.

Por que, sim, essa é uma FC classicona. E, como representante de primeira grandeza do gênero que é, há discussões que englobam moral, ética, formas de governo e etc. O que mais diferencia, para mim, as FC clássicas das que são publicadas pelos autores atualmente – com exceções – é o foco narrativo: na clássica, elas são questionadoras do papel do homem em um futuro imaginário mas coeso, o que faz dele até mais hipotético que imaginário. Já nas atuais, o foco é o triângulo amoroso adolescente. Mas não estou criticando, acho que, se se considerarem as devidas proporções, cada qual tem sua razão de ser, e valem a pena serem lidas. Eu mesmo já me senti satisfeito com representantes de ambos os lados.

É por esta característica questionadora que “Tropas Estelares” tem sido vista como “uma das mais polêmicas obras de ficção científica já escritas”. Acho um exagero. Ela fala de militarismo, de fidelidade, de civilidade, mas tudo voltado ao universo do livro. Outros reclamam do destaque dado ao treinamento militar de Rico e a falta de explicações de conceitos tradicionais da FC, como as viagens estelares. Não senti falta do que não encontrei, nem acusei o golpe do exagero naquilo que o autor entregou. Pra mim, tudo foi muito bem balanceado.

A partir desse livro não posso dizer mais que tenho uma trinca de autores preferidos de ficção científica. Se desde “Encontro com RamaArthur C. Clarke já se insinuava uma tendência de eu tornar a trinca uma quadra, a partir de agora, Asimov, Aldiss e Bradbury tem mais dois companheiros. Minha trinca virou um panteão.

 


Esse mundo é pequeno e coincidências existem! Enquanto estava escrevendo esta resenha, o tradutor do livro, Carlos Angelo, deu RT em um tuíte em que eu, como quem não quer nada, pedia à Aleph – que vem publicando clássicos da FC com muita competência – desse uma olhada no Robert A. Heinlein e publicasse os livros dele por aqui, já que as obras do autor, inclusive o “Tropas”, se encontram fora de catálogo. Pois ele disse, também por lá, que a própria Aleph está preparando uma nova edição do livro ;) Então fiquem atentos, é leitura obrigatória!

Atualizado às 17h52: Quando quer, o universo conspira a favor! Hoje, 7 de Julho, é o aniversário de nascimento do autor. Não havia atentado pra isso, mas fui avisado pelo Carlos Angelo, o próprio tradutor do livro, via Twitter. Fiquei tocado. Sendo assim, essa resenha tem uma razão de ser ainda mais especial.


 

Tropas Estelares, de Robert A. Heinlein (Starship Troopers, 1960 Tradução de Carlos Angelo, 1998) – 275 páginas, ISBN 8570850190, Editora GRD.

{A+}

 

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13 comentários:

  1. "Tropas Estelares" foi escrito depois da II Grande Guerra, quando a memória do poder militar ainda estava fresco na cabeça do mundo todo e depois disso uma onda de Ditaduras Militares varreu o mundo, a America em especial, com o mundo bipolarizado pela Guerra Fria e o raio que o parta... Talvez por está imerso nesse universo ele imaginou um futuro no qual talvez houvesse apenas uma nação e a cidadania fosse privilegio de quem fizesse parte do exercito... Fiquei curiosa com essa história, com esse livro, com essa proposta. Eu não sou uma leitora cativa de ficção cientifica, acho que você sabe, e além disso sou um pouco fraca em relação a leitura de coisas escritas na primeira metade do século XX... Mas me interessei, e vou esperar o lançamento para correr atrás.

    Cheros Luciano, mais um livro/autor que você joga no meu mapa afetivo!!! Desse jeito nunca me faltará um livro a ser lido kkkk

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    1. Pandora, e, para completar, o Heinlein serviu às forças armadas, muitos dizem que vem daí sua maior fonte de inspiração, o que também gera algumas críticas..... Vale a pena ler, é Fc de primeira grandeza.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Mais uma coincidência: você publicou a resenha justo no aniversário de Heinlein!

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  4. Estou apaixonada pela resenha ♥
    Perfeita!
    Aquele nosso cientista que criou o exoesqueleto, numa entrevista ele disse que se inspirou neste livro. Isso é ficção científica de verdade!!
    E o Carlos Angelo aí de cima é fera demais da conta nas traduções! Sou fã desse cara!
    E sou sua fã também por trazer uma resenha tão maravilhosa de um livro tão incrível!
    E sou fã da Aleph, porque né!! Como não amar??

    Estou ansiosamente esperando o relançamento desta obra!!

    Amei demais!!

    Bjks

    Lelê - http://topensandoemler.blogspot.com.br/

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    1. Lelê, a tradução é caprichada, nos envolve completamente, e o livro pela qualidade que tem merecia isso! Se tiver a oportunidade de ler, leia, é coisa fina!

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  5. Adorei essa resenha! Não é lindo quando o universo conspira? Hahahaha Eu sempre fui daquelas "ai credo, sci-fi, odeio", mas percebi que o que me faltava era repertório. Depois de Homem-Máquina, Entremundos e Guia do Mochileiro, estou bem mais aberta a esse gênero e vou incluir Tropas Estelares na minha wishlist, com certeza! E sim, se o Gaiman E o Martin indicam, é minha obrigação conferir.

    Abraços!!!

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    1. Ahhhh! Leia mais FC, é um gênero do qual gosto muito e me sinto tão em casa quanto lendo policiais! Vale a pena ;)

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  6. Resenha incrível!
    Cara, eu só posso ser muito desligada, pois eu já tinha assistido ao filme(claro, a muito tempo) e adorei, mas eu não sabia que ele tinha sido baseado em um livro. E agora com essa descoberta, vou esperar ansiosa para o relançamento dele.
    Parabéns pela resenha, perfeita, inspiradora e muito bem estruturada, simplesmente me conquistou! Totalmente sem palavras para ela.

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    1. Bárbara, eu demorei um pouco pra relacionar o filme com o livro também, e olha, o livro é infinitamente superior! Se puder ler, leia, é muito bom!

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  7. Luciano, achei no começo que sua resenha era uma homenagem ao nascimento do Heinlein! rs

    "O que mais diferencia, para mim, as FC clássicas das que são publicadas pelos autores atualmente – com exceções – é o foco narrativo: na clássica, elas são questionadoras do papel do homem em um futuro imaginário mas coeso, o que faz dele até mais hipotético que imaginário. Já nas atuais, o foco é o triângulo amoroso adolescente." - dei umas risadas com isso! Interessante seu discernimento, por isso prefiro os clássicos, sempre. E diria, até, que, que eles nos levam a questionar o papel da humanidade agorinha mesmo, e sempre.

    Do Heinlein quero começar com Stranger in a Strange Land, e meu próximo na lista de leituras é o Clarke, com seu 2001.

    Um grande abraço! ;)

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    1. Eu acho que fui um pouco maldoso, mas vamos lá! Rsrs.

      Do Clarke eu li o "Encontro com RAMA" e gostei muito, quero partir para mais livros dele muito em breve, FC é um gênero que me cai sempre bem.

      Dois abraços ;)

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