Sinopse: Eis um Bukowski puro-sangue. Legítimo. Concluído alguns meses antes de sua morte, em março de 1994, aos 73 anos. Não há como sair incólume desta história. A saga de Nick Belane poderia até ser igual a de tantos outros detetives de segunda categoria que perambulam pelas largas ruas de Los Angeles. Mas aqui, mulheres inacreditáveis cruzam pernas compridas e falam aos sussurros, principalmente uma que atende pelo nome de Dona Morte. Como nos velhos livros policiais de papel vagabundo, subliteratura pura, a quem Charles Bukowski dedica solenemente Pulp. Ele desafia sua história com habilidade de mestre. Um Rabelais percorrendo o mundo noir? A divina sujeira? A maravilhosa sordidez? Um acerto de contas com a arte? Uma homenagem? Uma reflexão sobre o fim da vida? E tomara que a morte estivesse linda, gostosa e sexy – como está nesta história – quando encontrou o velho Buk poucos meses depois de ter posto o ponto final nesta pequena obra-prima.
Conheci o velho safado há alguns anos, quando li “Hollywood” e, imediatamente, me tornei fã. A escrita fluída, compulsiva, verdadeira e – em cada parágrafo – visceral me conquistaram. Tirar onda de si mesmo é uma arte, e Bukowski faz isso com seus personagens como ninguém. Eu sou suspeito para falar sobre ele.
Pulp foi seu último romance, concluído pouco antes de sua morte em 1994 – completa-se dezenove anos de falecimento neste sábado – e nos mostra Nick Belane, um detetive cinquentão, fora de forma, com dezenas de pendências em sua vida que vão da habilitação vencida aos dentes mal escovados, e que ultimamente não consegue nem mesmo tomar um trago em paz em um bar – e todos sabemos como bares são importantes para detetives do noir – sem que algum espertinho, incluindo os barmen, lhe sejam desagradáveis.
E Belane não é um detetive comum. Trabalhando a seis dólares a hora, consegue como clientes figuras as mais estranhas possíveis, como Dona Morte, que anda com o pé atrás achando que viu um cara perambulando por aí que já deveria estar morto há muito tempo; o dono de uma funerária que está sendo perseguido por uma alienígena; e um sujeito que procura um pardal vermelho.
É bem diferente das tradicionais mortes e consequentes investigações de livros de detetive que se vê por aí, mas, como se trata de um Bukowski, não teria graça alguma se não fosse assim.
Bukowski é um boca suja e não é à toa que o chamam de “Velho Safado”. Mas é preciso observar que este epíteto lhe é dado no mesmo tom elogioso que chamam Agatha Christie de a “Rainha do Crime”. Isso porque em seus livros ele pode até soltar uma porção de palavrões, mas isto não deixa o texto pesado, é algo espontâneo, que faz parte de seus personagens, e que, de forma alguma, foi colocado ali para chocar o leitor.
Bukowski não faz da boca suja uma ferramenta baixa para chamar atenção. Neste livro, por exemplo, ele quebra todos os recordes do uso da expressão “Eu vou botar no rabo dela!” enquanto Belane investiga uma esposa possivelmente adúltera, mas antes de se torcer a cara a gente apenas sorri, entendendo que aquilo faz parte do que ele é, e, acima de tudo, Belane é um cara foda. E ponto.
- Que tipo de detetive é você? – perguntou Celine.
- O melhor de L.A.
- É? E o que quer dizer L.A.?
- Los Asnos.
Como escritor, Bukowski é irônico, sarcástico, autodepreciativo. Gosto dele da mesma forma que gosto de Crais, por seus detetives se parecerem, com uma consciência e uma sabedoria ímpares de conseguirem entender a vida que deixaria muitos filósofos no chinelo, ao mesmo tempo em que têm plena consciência de suas falhas, seus desvios, e da grande roubada que é o mundo à sua volta.
Eu tinha talento. Tenho talento. Às vezes, olhava minhas mãos e compreendia que podia ter sido um grande pianista. Mas o que tinham feito minhas mãos? Coçado o saco, preenchido cheques, amarrado cadarços, puxado descargas de banheiro etc. Desperdicei minhas mãos. E minha mente.
Pra quem não conhece Bukowski, Pulp é um bom livro pra se começar. Não é tão longo quanto Hollywood, mas toda a essência deste clássico está aqui. Personagens carismáticos, traços autobiográficos – embora aqui em medida muito menor –, e um autor plenamente consciente de sua arte. O bom de Bukowski é que ele é pra todos, sem se tornar ordinário.
"Frequentemente, os melhores momentos na vida são quando a gente não está fazendo nada, só meditando, ruminando. Quer dizer, a gente pensa que todo o mundo é sem sentido, aí vê que não pode ser tão sem sentido assim se a gente percebe que é sem sentido, e essa consciência da falta de sentido já é quase um pouco de sentido. Sabe como é? Um otimismo pessimista."
Ao Velho Safado ;)
Pulp, de Charles Bukowski (Pulp, 1994 –Tradução de Marcos Santarrita,2009) 184 páginas. ISBN 9788525418630 L&PM Pocket. [Comprar no Submarino]
{A+}
Bukowski e Gorki são dois dos autores mais significativos que você colocou no meu mapa de autores a serem lidos! Como sempre resenha perfeita, mas com um toque de paixão a mais que só os livros A+ conseguem arrancar de você Luciano!
ResponderExcluirJaci, indico os dois e com força! Cada qual em seu estilo, dominam completamente a narrativa. Vale ler ;)
ExcluirOi Luciano, tudo bem?
ResponderExcluirAinda não li nada do Velho safado, mas acredito que mesmo sendo o tipo de pessoa que não gosta muito de ler palavrões, por incrível que pareça, acho que gostaria de suas obras. E porque? Bem, como você disse, e como está exposto nesse pequeno quote, é algo que faz parte da personalidade do personagem a tal ponto de ser estranho não ouvi-lo falando um palavrão. Gostei muito da resenha e fiquei com curiosidade quanto ao livro e ao autor.
Abraços,
Amanda Almeida
Você é o que lê
Amanda, quando puder leia! Bukowski tem uma forma despreocupada de narrar seus livros que faz com que a leitura voe. Vale ler ;)
ExcluirBukowski é um autor que tenho vontade de conhecer um pouco mais. Já tive a oportunidade de ler alguns de seus contos, e gostei bastante. Fiquei curioso acerca de Pulp, mas, Misto-Quente é o que mais me chama a atenção. Boa resenha!
ResponderExcluirAbraços
Juan - sempre-lendo.blogspot.com.br/
Juan, devo ler "Misto Quente" ainda este mês ;) e, sim, estou bem ansioso.
ExcluirParece que quanto mais a gente gosta do livro, melhor fica a resenha né? Estou te aplaudindo em pé por mais uma maravilhosa escrita. Ja que não conheço o autor muito bem, vou começar com Pulp, como você indicou.
ResponderExcluirBeijos. Tudo Tem Refrão
Ágata, concordo plenamente! Pulp ou Hollywood são dois bons títulos pra começar a ler o autor ;)
ExcluirTenho um pezinho atrás com Bukowski. Ele é um desses poucos gênios para quem trabalhar muito não influencia na sua qualidade literária, e não hesitava em aconselhar jovens escritores a simplesmente "não tentar", só escrever quase que como por inspiração divina. Mas daí a dizer para pessoinhas fazerem o mesmo, bom, é quase uma garantia de fracasso.
ResponderExcluirAh, ele tem esse lado de "guerrilha", mas eu fico com a grandeza da "pequenez" de seus personagens e suas expectativas. Mas, concordo, talvez faça mais sentido para a época.
ExcluirSempre tive curiosidade em ler Bukowski, mas não passou disso até o momento! rs. Eu só fã das leiturinhas fáceis e por vezes até bobas! Autores geniais que li foram George Martin e Tolkien.
ResponderExcluirBeijos,
Vinícius - Livros & Rabiscos
Vinícius, se tiver a oportunidade, leia!
ExcluirOi Luciano!
ResponderExcluirEu sempre ouvi falar muito bem dos romances de Bukowski, mas acredita que nunca tive oportunidade de ler um? Acho que nem nunca vi um exemplar ao vivo.
Mas fui procurar esse para comprar e nem é tão caro quanto eu esperava (mas claro que é a versão pocket)! Minha visão de Bukowski como sendo um autor que eu demoraria muito para ler acabou de mudar totalmente.
Acho que muito em breve vou conhecer esse autor e comprovar toda essa genialidade dele.
Um beijo,
Luara - Estante Vertical
Luara, eu li ele no Kobo, mas tenho o "Mulheres" na versão pocket da L&PM e acho ela linda ;) Vale a pena ler, mas ele é do tipo ame ou odeie. Espero que você goste ;)
ExcluirAi que vontade de ler esse livro!!! Sua resenha está perfeita, como sempre, e esse livro tem aquele jeito de que vai me conquistar. Mais um para minha maldita e interminável lista, pare de indicar livros bons PELOAMORDEDEUS!
ResponderExcluirhahahaha abração!
Lu, Bukowski provoca esta reação na gente, é impossível ler e sair da leitura como entrou. Se tiver as oportunidade, leia ;)
ExcluirLuciano, eu já achava que estava devendo umas leituras a Bukowski. Depois dessa sua excelente resenha, então, fui correndo dar uma olhada nos outros livros dele.
ResponderExcluirBeijo!
Ana, também quero muito ler mais obras do autor. Não tem como não se tornar fã.
ExcluirVejo que as suas leituras tem sido muito prazerosas já que conseguiram de você um A+. Ótima resenha e depois disso já coloque o Pulp na lista para conhecer o autor Bukowski.
ResponderExcluirSaleta de Leitura
Irene, se encontrá-lo, que tenha uma boa leitura ;)
ExcluirNão gosto muito desse tipo de livro, mas a resenha está ótima
ResponderExcluirAdorei a resenha, mas não sei se vou ler este livro!
ResponderExcluirParece ser um livro de se tirar várias gargalhadas mesmo, imperdível! Não conheço o autor mas me animei a ler alguma obra dele
ResponderExcluirTenho muita vontade de ler algo de Charles Bukowski (Obrigada, 16 Luas haha), sua resenha ta muito boa! Me encorajou, haha
ResponderExcluirhttps://411dreams.blogspot.com/
Me interessei. Vou tentar ler.
ResponderExcluirJessica Neves